Era uma vez um jovem que vivia no meio das altas montanhas, lá onde se chega por um caminho bem estreito, parecido com uma corda. Não tinha ninguém no mundo; vivia totalmente isolado na sua pequena casinha de bambu, tendo apenas dois braços fortes para viver e explorar um pedacinho de terra, onde cultivava arroz.

Um dia, depois da colheita, houve uma feira na cidade vizinha; pegou duas medidas de arroz e foi-se vale abaixo, seguindo o caminho estreito.

Depois de ter vendido seu arroz, fez um passeio no meio dos feirantes, sentindo-se atraído por uma barraca que colocava à venda pincéis e potes de tintas, carvão e um papel de arroz bem fino.

O jovem ficou com grande vontade de experimentar pintar, também ele, alguma coisa. Mas só tinha nas mãos algumas moedas que não eram suficientes para comprar coisas tão caras! Finalmente pensou que ao menos poderia comprar um pedacinho de carvão. Depois de muita hesitação, acabou comprando-o pelo dinheiro que ganhou com a venda do seu arroz. Muito impaciente, apressou-se em voltar para seu casebre e começar a pintar. Aquilo que há tanto tempo havia sonhado acabou se tornando realidade.

Como se sentia triste por sempre estar tão sozinho,  pintou um búfalo com um pelo de seda, da cor cinza, com os olhos cheios de sabedoria e um chifre no meio da testa.

– Você, meu caro – suspirou o rapaz -, se você quiser ficar comigo para me ajudar a arar minha terra, como seria muito mais divertido! Seríamos parceiros! Logo depois foi pendurar o desenho na parede de seu quarto. Saiu da casa, mas ficou simplesmente paralisado de espanto. Pois, diante de sua porta, encontrava-se um búfalo de pelo cinzento, olhos cheios de sabedoria e um só chifre na testa. O jovem esfregou os olhos, beliscou a mão, para se certificar de que estava acordado e que de fato havia ali um búfalo que lhe acenava com a cabeça de maneira muito gentil. Nem podia acreditar no que estava vendo.

Correu até seu quarto para ver o búfalo que acabara de desenhar. Mas a folha estava em branco, não havia traço algum. Dali ele compreendeu que o búfalo, com o pelo de seda cinzento e um único chifre e que estava em frente de sua porta era o mesmo que tinha desenhado.

Após tal incidente, o jovem viveu feliz e satisfeito com seu companheiro, o búfalo com um único chifre. De dia trabalhavam juntos no arrozal, e de noite se deitavam juntos, um encostado no outro.

Mas, um dia, um batalhão de soldados do imperador veio passar por ali, a fim de fazer manobras militares. Eles vieram por aquele pequeno caminho que levava até o casebre do rapaz.

– Vejam só, que búfalo estranho, com um único chifre! – exclamou um dos soldados. – Deve ter uma carne bem boa e certamente o nosso imperador irá apreciá-la!

O jovem fez o que pôde, suplicou aos soldados que não tocassem no animal, mas de nada adiantou. Os soldados levaram embora a única alegria do jovem, que ficou inconsolável.

– Devolvam-me o meu amigo – gritava chorando. O rapaz seguiu os soldados através de montes e vales, até que todos chegaram diante da porta dourada do palácio imperial. Só que esta antes se fechou na cara do rapaz, logo que os soldados entraram com sua presa. O coitado ficou do lado de fora.

– Guarda! Suplico-lhe, abra-me a porta e devolva-me meu amigo! – implorava. É meu único consolo, único amigo e única alegria neste mundo. Não tenho mais ninguém, a não ser ele! – Mas suas súplicas foram em vão. 

Ficou lá sentado ao lado da porta do grande palácio imperial, a cabeça nas mãos, chorando a não mais poder. Depois de certo tempo, a porta se abriu e os soldados lhe jogaram o chifre do búfalo e os seus ossos. Disseram-lhe, caçoando:

– Eis o que sobrou de teu amigo. O imperador te agradece e te faz saber que se deliciou bastante.

O rapaz juntou os ossos e o chifre, os embrulhou com cuidado num pano e tomou o caminho de volta para sua casa. Por todo lugar que passava, chorava, mas nem assim conseguiu devolver a vida ao seu companheiro. Ao chegar a casa, foi pendurar o chifre na parede de seu quarto. Depois saiu para cavar um buraco e enterrar os ossos. Logo, no lugar mesmo que enterrou os ossos do búfalo unicórnio, nasceu da terra um broto verde de bambu. Crescia e crescia, não precisando de muito tempo para virar um bambu adulto bem alto. O rapaz ia todos os dias ver o crescimento do bambu, acariciando-lhe as folhas e ouvindo o barulho doce que faziam. O bambu ficou forte e cresceu tanto, que um dia seu topo se perdeu dentro das nuvens brancas. “Certamente não é um bambu comum”, dizia-se o jovem, “preciso ver até onde está chegando”. Por isso se pôs a subir pelo caule do bambu. Foi subindo alto, cada vez mais alto. A cabeça lhe virava, mas continuava subindo. Chegou até uma grande nuvem branca. Afastou as brumas, abrindo-se na sua frente uma grande porta azul. Não hesitou um momento para avançar com segurança e transpor a porta, lá no céu mesmo. Como era bonito! Flores por todos os lados, e que perfume! Na superfície azul, em pequenas barcas formadas por nuvens, navegavam fadas. De repente uma delas percebeu o rapaz. Deu um grito e todas as fadas desapareceram como por encanto. O céu também desapareceu. Só sobrou um topo de montanha que se destacava através das nuvens brancas. De repente o bambu se pôs a vibrar, estremeceu e começou a encolher, ficando cada vez menor, até desaparecer e o jovem de novo se encontrar sobre a terra nua.

Tudo aconteceu tão rápido, que nem sabia se fora real ou se apenas tinha sonhado. Só que permanecia a lembrança das belas fadas do céu, tão lindas, que ficou sonhando como teria sido feliz se pudesse ter uma delas por mulher. Só que agora o céu estava tão distante, tão distante! Todos os dias, a partir deste instante, o rapaz só tinha uma ideia na cabeça: como achar o meio de voltar ao céu.

Uma noite teve um sonho. Reviu seu velho amigo, o búfalo unicórnio, que lhe sorria com seus olhos inteligentes e lhe disse com uma voz humana:

– Por que você se atormenta? Você esqueceu-se de seu desenho? Se você quer conquistar uma das fadas para tê-la como mulher, experimente desenhá-la. Se você tiver sucesso com seu desenho, tome meu chifre que você pendurou na parede e use-o como trombeta!

Logo, ao acordar, o rapaz correu para pegar uma grande folha de bananeira. Voltou para dentro de casa, pegou o carvão e se pôs a desenhar. No final do décimo dia conseguiu desenhar uma cara tão bonita da jovem fada, que ficou muito emocionado. Lembrando-se das palavras do búfalo unicórnio, tirou o chifre dele da parede, encostou os seus lábios nele e o fez ressoar. Logo tudo vibrou, um perfume celeste o envolveu e uma luz rosada iluminou o quarto. A fada destacou-se do desenho, sorriu-lhe amavelmente e pôs os pés na terra.

  – Irmãozinho – lhe disse – , serei a tua esposa. Você vai trabalhar no arrozal enquanto eu cuido da casa e iremos nos amar muito. A seguir estendeu a sua linda mão ao rapaz.

Neste dia a felicidade entrou na casinha de bambu. O jovem e sua mulher fada viviam na felicidade perfeita. Até que…

Até o dia em que, fazendo manobras militares na montanha, os soldados do imperador vieram a passar de novo por ali.

– Vejam só, que beldade! – gritou um dos soldados, vendo a fada. – Certamente agradaria ao nosso imperador!

E os soldados, sem considerar os choros do rapaz e suas lamentações, levaram-na à força.

Por montes e por vales, por cima dos precipícios, descendo ladeiras, o rapaz correu no encalço dos soldados, até chegar à porta do palácio imperial. Chorou, suplicou, dizendo que não poderia viver sem sua mulher amada, mas de nada adiantaram seus protestos. Recebeu do guarda imperial apenas insultos e pauladas.

Com o coração em desespero, abandonado, o rapaz voltou para sua casa. Mas de repente a sua face se iluminou. “Tenho uma ideia”, pensou, já recomposto.

Rápido pegou seu carvão e se pôs a desenhar numa folha de bananeira. E da folha saiu num instante um tigre alado que mostrava seus terríveis dentes prestes a morder e pular. O rapaz tirou da parede o chifre do búfalo, o fez soar até fazer tremer a montanha. O tigre pulou fora da imagem, o rapaz montou nas suas costas e juntos saíram correndo em direção ao palácio imperial. Vendo a fera solta, os guardas ficaram em pânico. Com muito medo, fugiram do palácio, deixando os portões abertos. Em dois pulos o tigre alado se instalou na sala do banquete, no momento em que lá entravam os cortesãos com a fada, que, acorrentada e em lágrimas, era levada ao imperador. O tigre rugiu de maneira estrondosa, abriu sua goela enorme e dum gole só engoliu o imperador e sua corte.

O rapaz correu em direção à sua querida esposa fada, a tomou pela cintura e a colocou nas costas do tigre. Em alguns pulos passaram por cima dos precipícios e logo chegaram diante da casinha de bambu. Depois de ter deixado os dois, o tigre abriu as asas e levantou voo para em seguida desaparecer no meio das nuvens.

Depois dessas aventuras, o jovem viveu finalmente feliz e tranquilo com sua esposa fada. Se não morreram, devem estar morando ainda lá na sua montanha.

Versão e tradução: Jette Bonaventure.

Veja o contexto em que esta história foi contada AQUI.

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