Semana Especial – Histórias de Anões, Duendes e Gnomos, de 20 a 25/08/2018.

A nossa última história da semana é o meu conto de fadas preferido da infância: “Rosa Branca e Rosa Vermelha”, dos irmãos Grimm, que eu ouvi, li e reli muitas vezes. Até hoje as imagens desse conto são vívidas para mim e confesso: nunca gostei do anão dessa história – mal educado e petulante!

Mas apesar desse anãozinho, resolvi incluir essa narrativa na minha seleção, pois ela é de uma riqueza indescritível. É um conto que pode ser contado para crianças a partir de 5 anos.

Muitos podem conhecê-lo por outro título: “Alva Neve e Rosa Rubra” ou “Branca de Neve e Rosa Vermelha”.

Essa versão é resultado de uma revisão que eu fiz, a partir de outras duas versões. Mantive as imagens primordiais, imprescindíveis ao conto.

Espero que tenha gostado dessa Semana Especial, tanto quanto eu!

Um forte abraço de duende,

Ana Flávia Basso

 

Rosa Branca e Rosa Vermelha (irmãos Grimm)

 

Uma pobre viúva vivia isolada numa pequena cabana, na frente da qual havia um jardim com duas roseiras, uma de rosas brancas, uma de rosas vermelhas. A mulher tinha duas filhas, que se pareciam com as duas roseirinhas: uma se chamava Rosa Branca e a outra, Rosa Vermelha. Eram ambas tão boas e devotas, tão trabalhadeiras e bem-humoradas, como poucas crianças no mundo inteiro, mas Rosa Branca era mais quieta e mais suave que Rosa Vermelha.

Rosa Vermelha gostava de pular pelos campos e prados, colher flores e caçar borboletas; Rosa Branca preferia ficar em casa com a mãe, ajudava-a nos serviços caseiros ou lia para ela, quando não havia o que fazer. As duas crianças amavam-se muito e, quando saíam juntas, andavam sempre de mãos dadas.

Quando Rosa Branca dizia: – “Nós nunca nos separaremos”, Rosa Vermelha respondia: – “Nunca, enquanto vivermos”, e a mãe acrescentava: – “O que uma possuir, deverá repartir com a outra”.

Muitas vezes elas passeavam sozinhas na floresta, colhendo amoras. Os animais não lhes faziam mal nenhum e se aproximavam delas sem temor: o coelhinho comia uma folha de repolho em suas mãos, a corça pastava ao seu lado, o veado passava pulando alegre, e os passarinhos continuavam pousados nos ramos e cantavam a plenos pulmões. Nunca lhes acontecia mal algum. Se a noite as surpreendia na floresta, deitavam-se lado a lado sobre o musgo e dormiam até o romper da manhã, e a mãe sabia disso e nunca se preocupava por causa delas.

Certa vez, passaram a noite na floresta e, quando a aurora as despertou, viram uma linda criança, de vestidinho branco brilhante, sentada ao lado delas. A criança levantou-se, olhou com carinho para as meninas, não disse nada e desapareceu na floresta. E quando elas se voltaram, viram que estiveram dormindo bem perto de um abismo, e teriam certamente caído nele, se tivessem andado mais alguns passos no escuro. A mãe porém lhes disse que aquele deve ter sido o ano da guarda das crianças boas.

As meninas mantinham a casinha da mãe tão limpa que dava gosto de ver. Durante o verão, Rosa Vermelha cuidava da casa e toda a manhã punha ao lado da mãe, antes que ela acordasse, um raminho de flores, no qual havia uma rosa de cada roseirinha do jardim. No inverno, Rosa Branca acendia o fogo e pendurava o caldeirão no gancho. O caldeirão era de cobre, mas brilhava como ouro, tão bem areado estava. À noite, quando caíam os flocos de neve, a mãe dizia:

– “Vai, Rosa Branca, e fecha o ferrolho”.

E então elas se sentavam perto da lareira, e a mãe pegava os óculos e lia trechos de um grande livro, e as duas meninas escutavam, sentadinhas, fiando. Ao seu lado, deitado no chão, estava um cordeirinho, e atrás delas, num poleiro, pousava uma pombinha, com a cabecinha debaixo da asa.

Uma noite, quando estavam assim aconchegadas, alguém bateu na porta, como se quisesse entrar. A mãe falou:

– “Depressa, Rosa Vermelha, abre; deve ser um forasteiro que procura abrigo”.

Rosa Vermelha correu e tirou a tranca da porta, pensando que era um homem pobre. Mas não era um homem, e sim um urso, que enfiou pela porta a sua grossa cabeça negra. A menina soltou um grito e pulou para trás; o cordeirinho baliu, a pombinha bateu asas e voou, e Rosa Branca escondeu-se atrás da cama da mãe.

Mas o urso começou a falar e disse:

– “Não tenham medo, eu não lhes farei mal; estou congelado e só quero aquecer-me um pouco aqui”.

– “Pobre urso, – disse a mãe, – deita-te junto ao fogo, mas cuidado para não chamuscar o pêlo.

E chamou então: “Rosa Branca, Rosa Vermelha, apareçam! O urso não lhes fará nada, ele fala sério”.

As duas apareceram, e pouco a pouco também o cordeirinho e a pombinha se aproximaram, já sem medo. O urso disse:

– “Meninas, sacudam um pouco a neve do meu pêlo!”

E elas pegaram a vassoura e limparam o seu pêlo; em seguida, o urso estendeu-se diante do fogo, grunhindo contente e satisfeito. Não demorou muito, elas ficaram confiantes de todo e brincaram com o desajeitado hóspede.

Puxavam-lhe o pêlo com as mãos, punham-lhe os pezinhos nas costas e sapateavam para lá e para cá, ou pegavam uma varinha de nogueira e batiam nele, e quando ele rosnava, elas riam. O urso porém deixava-as fazer o que queriam, e só quando elas passavam da conta, ele gritava:

– “Deixem-me vivo, meninas!”

“Rosa Vermelha, Rosa Branca

Batam menos por favor,

Se matar vocês não querem

Este seu libertador”.

Quando chegou a hora de dormir e as meninas foram para a cama, a mãe disse ao urso:

– “Podes pousar aqui mesmo, junto ao fogo, em nome de Deus, pois aqui estarás protegido do frio e do mau tempo”.

Logo que amanheceu, as meninas abriram a porta e deixaram-no sair, e ele voltou pela neve para a sua floresta. A partir desse dia, o urso vinha todas as tardes à mesma hora, deitava-se junto ao fogão e deixava as crianças se divertirem com ele à vontade, e elas ficaram tão acostumadas com ele, que não punham a tranca na porta até que chegasse o negro companheiro.

Quando chegou a primavera e tudo estava verde lá fora, certa manhã o urso disse a Rosa Branca:

– “Agora tenho de ir embora, e não poderei voltar durante o verão inteiro”.

– “E para onde vais, urso querido?” – perguntou Rosa Branca.

– “Devo voltar para a floresta e proteger meus tesouros dos anões malvados. No inverno, quando a terra está congelada, os anões têm de ficar lá embaixo e não conseguem sair. Mas agora que o sol degelou a terra e a esquentou, eles a furam, e sobem, para procurar e roubar. O que cai em suas mãos e vai parar nas suas cavernas não sai facilmente para a luz do dia”.

 

Rosa Branca ficou muito triste com essa despedida, e quando abriu a porta para o urso e ele se esgueirou para fora, ficou enganchado na fechadura, e um pedaço do seu pêlo ficou preso ali. Então pareceu a Rosa Branca que ela viu brilhar alguma coisa, como se fosse ouro, mas não tinha certeza disso. O urso saiu correndo apressado e logo sumiu por detrás das árvores.

Algum tempo depois, a mãe mandou as filhas para a floresta, juntar gravetos. Lá chegando, viram uma árvore caída ao solo, e no tronco, entre a relva, qualquer coisa se agitava, pulando de cá para lá. Ao se aproximarem, viram um anão, de rosto vermelho e encarquilhado, e longa barba branca como a neve. A ponta da barba ficara presa numa fenda da árvore, e o pequerrucho pulava de um lado para o outro tal qual um cachorrinho na corrente, e não sabia o que fazer para se livrar. Ele lançou um olhar furioso dos seus olhos vermelhos de fogo nas meninas e gritou:

– “Por que estais paradas aí sem fazer nada?! Não podeis vir me ajudar, não?

– “O que aprontaste, homenzinho”? – perguntou Rosa Vermelha.

_ “Ó menina burra e curiosa”, – respondeu o anão, – eu quis rachar este tronco, para ter lenha miúda na cozinha; com os pedaços graúdos, o pouquinho de comida que consumimos fica logo queimado; nós não devoramos tanta coisa como o teu povo grosseiro e glutão.  E eu já tinha cravado a cunha no tronco, e estaria tudo bem conforme eu desejava, mas a maldita madeira era lisa demais e a cunha saltou fora de repente, e a fenda fechou-se tão depressa que eu não tive tempo de puxar para fora a minha linda barba branca. Agora ela está presa, e eu não posso ir embora. E vós ainda ficais rindo, com vossas caras branquelas e lambidas! Irra, como sois nojentas!”

As meninas tentaram e fizeram muita força para livrar o homenzinho, mas não conseguiram desprender a barba, então Rosa Vermelha disse que precisariam de ajuda.

– “Suas burras”, – estrilou o anão, – “Chamar mais gente? Vós já sois demais para mim. Será que não vos vem uma ideia melhor”?

– “Não fiques impaciente”, – disse Rosa Branca, – “eu já vou te ajudar”. E ela tirou do bolso a sua tesourinha e cortou a ponta da barba.

 

Ao se ver livre, o anão agarrou um saco cheio de ouro, que estava entre as raízes da árvore, colocou-o sobre as costas e resmungou:

– “Gente grosseira, cortar um pedaço de minha bela barba! O diabo que vos recompense!”

 

Com isso ele foi embora, sem ao menos um olhar para as meninas.

Passado algum tempo, Rosa Branca e Rosa Vermelha foram pescar peixes para o jantar. Quando chegaram perto do rio, viram algo que parecia um grande gafanhoto grande saltitando à beira d’água, como se quisesse se atirar dentro dela. Aproximaram-se mais e reconheceram o não.

– “Para onde vais? Não queres pular na água?”

– “Não sou tão tolo assim”, – gritou o anão. – “Será que não estais vendo que é o maldito peixe que me arrasta para a água?”

O anão estivera sentado ali, pescando, e por azar o vento enroscou sua barba na linha do anzol. Quando logo em seguida um grande peixe mordeu a isca, faltaram forças à frágil criatura para puxá-lo para fora. O peixe levou a melhor e puxava o anão para junto de si. E embora ele se agarrasse a todas as moitas e gramas, não conseguia segurar-se e tinha de acompanhar os movimentos do peixe, com grande perigo de ser arrastado para dentro da água.

As meninas chegaram bem na hora, seguraram-no e tentaram livrar a barba da linha; mas em vão, barba e linha estavam muito embaraçadas. Não restava nada a fazer a não ser tirar tesourinha e cortar outro pedaço da barba. Quando o anão viu isso, berrou com elas:

 

– “Que maneira é essa, suas tolas, de envergonhar a cara de uma pessoa? Não contentes de cortar a ponta da minha barba, agora me cortais a melhor parte dela? Não posso mais me mostrar na frente dos meus!” E ele apanhou um saco cheio de pérolas, que estava entre os juncos, e sem mais uma palavra, arrastou-o consigo e sumiu por trás de uma pedra.

Pouco tempo depois, a mãe mandou as meninas à cidade comprar linha, agulhas, cordões e fitas. O caminho serpeava por uma planície de rochedos. Lá viram um grande pássaro pairando no ar, voando em círculos por cima delas, até pousar não muito longe, junto de uma pedra. E imediatamente elas ouviram um grito agudo e lamentoso. Correram e viram assustadas que a águia agarrara o anão, seu velho conhecido, e queria levá-lo embora. As meninas compadecidas seguraram logo o homenzinho e lutaram com a águia até que ela soltou a presa.

Quando o anão se refez do primeiro susto, gritou com voz estridente:

– “Não podíeis me tratar com mais cuidado? Vós puxastes pelo meu fino casaquinho até que ele ficou todo rasgado e esfarrapado, gentinha grosseira e desajeitada que sois!”

Depois pegou um saco cheio de pedras preciosas e deslizou para dentro da toca, entre os rochedos. Sem se incomodar com sua ingratidão, as meninas continuaram o seu caminho e providenciaram as compras na cidade.

Ao regressarem pela floresta, elas surpreenderam o anão, que tinha despejado o saco de pedras preciosas num lugar limpinho. Os raios do sol caíam sobre as pedras cintilantes, fazendo-as brilhar tanto, que as meninas, deslumbradas, pararam para contemplá-las.

– “Por que estais paradas aí de olhos arregalados feito macacos?” – gritou o anão, e sua cara cinzenta ficou escarlate de raiva. Ele ia continuar com seus insultos, quando se ouviu um forte grunhido e um enorme urso negro saiu da floresta.

O anão deu um pulo de susto, mas não teve tempo de alcançar um esconderijo: o urso já estava diante dele. Então ele gritou, com medo:

– “Querido urso, poupa-me! Eu te darei todos os meus tesouros. Olha as lindas pedras preciosas na tua frente. Poupa a minha vida; de que te serve um sujeitinho franzino e miúdo como eu? Não sentirás nem mesmo o meu gosto entre os dentes. Olha aí, pega essas duas meninas imprestáveis, isso sim te será um bom bocado, tenras e gordas como codorninhas novas, devora-as logo, pelo amor de Deus!”

O urso não se importou com suas palavras, deu uma só patada na perversa criatura, e ela não se mexeu mais.

As meninas tinham fugido, mas o urso gritou-lhes ao encalço:

– “Rosa Branca e Rosa Vermelha, não tenham medo! Esperem, que eu vou com vocês!”

 

Então elas reconheceram a sua voz e pararam, e quando o urso chegou até elas, a sua pele caiu de repente, e lá estava ele, um belo homem todo vestido de ouro.

– “Eu sou filho de um rei, – disse ele – e fui enfeitiçado pelo perverso anão, que roubou meus tesouros, e tive que correr pela floresta na forma de urso selvagem, até ser libertado pela sua morte. Agora ele recebeu o castigo merecido”.

 

Rosa Branca casou-se com o príncipe e Rosa Vermelha, com o irmão dele e eles repartiram os grandes tesouros que o anão acumulara na sua caverna. A velha mãe viveu ainda por muitos anos, feliz ao lado das suas filhas. Mas ela levou consigo as duas roseirinhas, que ficaram debaixo da sua janela e deram todos os anos as mais lindas rosas, brancas e vermelhas.

3 thoughts on “Semana Especial – 6ª história sobre Anões, Duendes e Gnomos

  1. Lindas histórias! Amei essa semana tão especial . Quando teremos mais?
    Concordo com você esse anão é muito grosseiro e mal educado.
    Fico encantada vendo seus vídeos e ouvindo suas histórias , parabéns!

    1. Olá, Maristela! Também amei fazer essa Semana e fico aqui, pensando na próxima… Teremos mais, sim. Perguntei no Facebook e YouTube quais temas vocês gostariam de ver numa próxima Semana e estou computando os votos! Em seguida, começarei a coletar e traduzir. Ah, esse anão! Sempre me deixou indignada quando criança e me fez desejar ainda mais as gentilezas! Obrigada pelo carinho. Bjos

  2. Olá, bom dia.
    Se for possível, quero receber o pdf com estas histórias da 6a semana especial (anões, duendes e gnomos).
    Grata,

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