Hoje é dia de viajar para a Hungria, pois a 6a história da Semana Especial Fadas vem de lá e se chama “A deslumbrante Rosa Dragonete” (um nome por si só inusitado e engraçado!).

Como o título já insinua, esta é uma história com um humor peculiar (observe o estilo do início da narrativa).

É também uma história longa, que pode ser contada de uma vez ou em capítulos, especialmente para crianças a partir de 6 anos.

Mantive a digitação como no texto original e as notas do tradutor ao final, para ajudar na aproximação com o texto e a cultura.

Boa diversão!

 

 A deslumbrante Rosa Dragonete

(Conto húngaro)

 

Crianças, vou lhes contar agora a história do príncipe dos dentes de ouro e da deslumbrante Rosa Dragonete.

Onde foi, onde não foi, mas em algum lugar certamente foi, pra cá dos sete reinos, além do mar Operenciano (1), bem pra lá do cafundó, onde fuça o porquinho rabicó, existia certa vez um grande monarca. Acreditem ou não, todo o Reino da Fantasia e mais um palmo lhe pertencia, mas mesmo que lhe pertencesse outro tanto, jamais olhos humanos puderam ver esse monarca sorrir. Aliás, nem a rainha. Suas noites eram passadas na maior tristeza, e a tristeza também lhes preenchia os dias, por não terem filhos. Sua preocupação constante era a pergunta: a quem deixar o grande Reino da Fantasia?

E o tempo passava. Uma noite, um velhinho bem grisalho apareceu à rainha em seus sonhos, dizendo-lhe:

– “Não ficai triste, Alteza, mas tomai nota: de hoje a um ano nascer-vos-á um menino extraordinário, de dentes de ouro, e não haverá outro igual em todo o mundo. Mas há um ‘porém’, que deverá ser levado em consideração: um dia, esse menino deverá ter por esposa a deslumbrante Rosa Dragonete”.

Ao acordar, a rainha se lembrou do sonho e ficou imensamente feliz. Sua felicidade, no entanto, ficou embaçada pela tristeza e preocupação. Ficou feliz por saber que teria um filho, e triste porque ela conhecia a história da deslumbrante Rosa Dragonete ou seja, que ela fora raptada do Reino das Fadas pelo rei do grande Reino dos Dragões, e um número incontável de jovens guerreiros e valentes paladinos, que haviam isso ao seu encalço para libertá-la, jamais voltara vivo.

O ano passou e, realmente, o velho grisalho tivera razão: a rainha teve um filho, uma verdadeira pérola de menino, uma criança extraordinária, de dentes de ouro, e tão esperto, que já no primeiro dia ficou em pé e falou.

Disse ao pai:

– “Paizinho, leve-me para a escola porque eu quero estudar”.

– “Como não, meu querido filho” – respondeu-lhe o pai. – “Vou mandar atrelar a minha carruagem dourada e vou te levar onde teu coração desejar”.

Passou um ano, quase dois, e o príncipe dos dentes de ouro, cresceu rapidamente tornando-se um rapaz valente e destemido; terminou seus estudos na escola, correu mundo, depois voltou para casa e disse à mãe:

– “A senhora se lembra, minha mãe, da profecia daquele velho grisalho?”

A rainha, cheia de tristeza, respondeu:

– “Lembro-me, sim, e como me lembro, meu querido filho! Aliás, preferiria não me lembrar”.

– “Não se entristeça, doce mãezinha – disse-lhe o príncipe -, irei procurar a deslumbrante Rosa Dragonete, mesmo que ela se encontre no fim do mundo, e vou raptá-la do rei dos dragões, nem que seja a última coisa que faça na vida!”

Em vão a rainha chorou, implorou ao filho que ficasse em casa, não desperdiçasse sua jovem vida. O príncipe dos dentes de ouro, porém, não sossegou, despediu-se do pai, da mãe, do pessoal da corte e foi enfrentar o mundo.

Andou, andou, por todos os sete reinos. Num dado momento, enquanto atravessava uma imensa floresta, notou um clarão saindo de uma poça d’água no meio da estrada. Aproximou-se, olhou, olhou e viu atolada na lama uma minúscula carruagem dourada, dentro da carruagem uma belíssima senhora e, embora seis pequenos esquilos estivessem atrelados à carruagem, eles não conseguiam desatolar a pequena viatura. O príncipe nem esperou que lhe pedissem, sem pestanejar pegou delicadamente a minúscula carruagem e a retirou da poça d’água.

– “Ora, ora, meu príncipe! Porque príncipe és, isso se vê pelo seu rosto” – falou a bela senhora -, “amor com amor se paga. Fica sabendo que sou a Rainha das Fadas, posso realizar um desejo teu, o que queres de mim?”

– “Se a senhora é a Rainha das Fadas, então a deslumbrante Rosa Dragonete é sua filha. Nada quero da senhora, apenas que me conceda a mão de sua filha”.

Ao ouvir isso, a Rainha das Fadas se entristeceu e, com os olhos marejados de lágrimas, respondeu ao príncipe:

– “Tens razão, ó príncipe. A minha filha é a deslumbrante Rosa Dragonete, mas ela não é mais minha porque o rei do grande Reino dos Dragões a raptou de mim, e não existe homem capaz de tirá-la de suas mãos. Mas é bom que fiques sabendo como é o rei do Reino dos Dragões: ele sova o ferro como se fosse massa de pão, esmigalha pedra como se fosse ricota e amassa madeira como se fosse cânhamo. Jamais poderás vencê-lo, mesmo que o tentes”.

– “Pela vida ou pela morte, pois ainda assim eu irei tentar” – disse o príncipe. – “Se ele é forte, também o serei, se ele sabe de uma coisa, eu sei de duas”.

– “Está bem” – disse a rainha -, “se realmente não te demoveres de tua intenção e não baqueares, vou te ajudar. Toma, aqui estão três fios dourados de cabelo provenientes de uma única raiz e um pedaço de barbante. Bate com esse barbante três vezes nos três fios de ouro e eles se transformação num corcel mágico, de poderes extraordinários, como jamais se viu igual no mundo, e o barbante será uma rédea de ouro e brilhantes. Monta nesse cavalo e ele te levará ao sopé de uma montanha muito alta, onde encontrarás uma fonte na qual deverás banhar-te. Teu cabelo ficará dourado e teu corpo se tornará resistente a qualquer espada enquanto tu próprio ficarás sete vezes mais forte do que agora. Ao lado da fonte há um salgueiral e entre os arbustos encontrarás uma espada enterrada na terra da qual apenas a ponta estará visível. Puxa-a, cinge-a à cintura e, ainda que te canses durante a luta estafante, ela combaterá sozinha, basta ordenar-lhe: espada, fora da bainha! Mas, infelizmente, nem isso será suficiente para saíres vitorioso, porque, repito, o rei dos dragões tem uma força descomunal. Portanto, vou te dar ainda três garrafas de tamanhos diferentes; cada uma delas contém um líquido fortificante. Em caso de necessidade, bebe primeiro da garrafa menor, depois da garrafa do meio e por último da garrafa maior. Assim, talvez, poderás vencer o rei do Reino dos Dragões”.

Dizendo isso, a rainha tocou os esquilos com seu chicotezinho de franjas de ouro e desapareceu como se tivesse sido engolida pela terra. O príncipe, que permanecera parado no meio da estrada, pegou os três fios de cabelo de ouro, bateu neles com o barbante e no mesmo instante se transformaram num belíssimo e fogoso tordilho, e o barbante se transformou numa rédea de ouro e brilhantes, tão cintilante que sua luz iluminou a imensa floresta.

O príncipe pulou no tordilho e, upa-upa!, o alvorecer o encontrou junto do sopé da montanha; lá ele se banhou na fonte e imediatamente seus cabelos ficaram dourados, e ele próprio passou a sentir-se sete vezes mais forte do que antes. Foi até o bosque de salgueiros e, realmente, ali se deparou com a espada semi-enterrada no chão; puxou-a e a pôs na cintura tornando a montar no cavalo.

O tordilho voava como o vento, aliás mais rápido que o próprio vento, quando de súbito ele estacou. O príncipe abriu os olhos e viu que o tordilho parara diante de uma ponte de cobre.

– “Qual o problema, meu querido cavalo?”

– “Nada, querido amo, simplesmente chegamos à ponte de cobre. Descanse um pouco, porque, como pode ver, ela está sendo guardada por dois dragões e enquanto você não os matar, não poderá entrar no grande Reino dos Dragões”.

O príncipe descansou um tantinho, depois avançou contra a ponte; os dois dragões no entanto, não foram suficientes nem para seu dedo mindinho, pois num piscar de olhos ele os estraçalhou em pedacinhos. Atravessou a ponte num salto e foi cair bem no interior do Reino dos Dragões. Era ali que ficava o castelo de diamantes do rei dos dragões, no meio de um lindo gramado de fios de seda. Naquele exato momento estavam cortando a relva de seda com foices de ouro, e recolhendo a grama cortada com forquilhas de diamante para erguê-la em medas. E lá estava também a deslumbrante Rosa Dragonete, sentada tristonha debaixo de uma árvore.

O príncipe dos dentes de ouro cavalgou até ela, cumprimentou-a gentilmente, e lhe disse:

– “Não chore, nem fique triste, ó deslumbrante Rosa Dragonete, vim para salvá-la”.

E ela respondeu mais triste ainda:

– “Do jeito que você chegou pode voltar, porque jamais conseguirá me libertar, devo fenecer e morrer aqui”.

– “O rei dos dragões está em casa?” – perguntou o príncipe.

– “Não está” – respondeu Rosa Dragonete – “mas ele vem par almoçar e então…, pobre de você, meu príncipe!”

– “O que terá de ser, será, belíssima Rosa Dragonete” – disse o príncipe. “Um velho grisalho profetizou um dia à minha mãe que você será a minha esposa, e vim buscá-la. Você quer ser libertada?”

– “Ai, é claro que quero!”

– “Bem, se é realmente isso que você quer, então vou levá-la daqui”.

Enquanto o rei dos dragões estava ausente, Rosa Dragonete contou em segredo ao príncipe que no porão havia um barril, que provavelmente continha a força do rei dos dragões, porque ele costumava beber daquele barril.

Disse o príncipe:

– “Me encha um cantil daquela bebida, quero experimentá-la já”.

Nesse entretempo chegou meio-dia, hora de o rei dos dragões voltar para casa em seu cavalo mágico, e no momento em que ele entrou no pátio se deparou com o príncipe dos dentes de ouro.

– “Você chegou em boa hora” – gritou rei. “Estava à sua espera, príncipe dos dentes de ouro! Venha, vamos lá fora até a eira de chumbo, vamos ver quem de nós é o mais forte”.

Saíram então até a eira de chumbo, lá o rei rapidamente cortou uma rocha ao meio com seu canivete de cabo de madeira e, jogando uma metade para o príncipe, disse-lhe:

– “Então, príncipe dos dentes de ouro! Esmigalhe esse pedaço de rocha, como eu farei com a minha metade, depois acreditarei que você é mais forte do que eu”.

E imediatamente esfarelou a rocha, transformando-a em farinha.

– “Ora, isso não é nada” – disse o príncipe e espremeu o pedaço de rocha, fazendo escorrer água dela.

– “Vejo” – disse o rei dos dragões – “que você é um rapaz muito forte, agora já podemos lutar. Espere um minuto que vou correndo até a adega para buscar minha espada.

– “Nada disso! Nem pense numa coisa dessas!” – gritou o príncipe. “Fique por aqui mesmo, vamos lutar sem espada”.

– “Está bem, como quiser, vamos lutar sem espada” – e o rei dos dragões agarrou o príncipe pela cintura e o atirou ao chão com tamanha violência, que ele se enterrou no chumbo até os joelhos.

É mas o príncipe também não deixou por menos, pulou fora do buraco, agarrou o rei dos dragões, fê-lo rodopiar no ar e o atirou ao chão onde ele se enterrou até a cintura.

Mas o rei dos dragões também não entregou os pontos, saltou para fora e enterrou o príncipe no chão até o pescoço.

– “Espere só!” – berrou o príncipe. “Você se deparou com um seu igual!”

Desvencilhou-se, agarrou o rei dos dragões pela cintura e o enterrou no chão até o nariz.

Dessa vez ele não conseguiu nem se mexer, muito menos sair. Pôs-se, então, a implorar pela sua vida. E o príncipe dos dentes de ouro disse:

– “Está bem, não quero a sua vida, quero apenas a deslumbrante Rosa Dragonete”

E dizendo isso o príncipe se dirigiu ao castelo, mas nem chegou a alcançar o portão, pois foi impedido de prosseguir pelo rei dos dragões, que de alguma maneira conseguira se libertar do buraco:

– “Ei, príncipe dos dentes de ouro! Espere só um pouquinho, vamos lutar mais uma vez”.

Mas agora o príncipe também se preveniu: pegou as três garrafinhas que a rainha das fadas lhe dera e esvaziou as três de uma só vez, e só depois avançou contra o rei dos dragões.

Não lutaram por muito tempo, logo o rei dos dragões deu om a cara no chão e exalou o último suspiro.

A deslumbrante Rosa Dragonete não cabia em si de contente, e claro que o príncipe também não se entristeceu. Com uma vara de ouro, Rosa Dragonete bateu no castelo de diamantes, que se transformou numa linda e esférica maçã diamantina, que ela guardou no seio e os dois montaram no tordilho, só parando quando chegaram ao Reino das Fadas, no palácio do rei. Lá celebraram imediatamente o casamento, em grande estilo e com muita festa, e logo a seguir continuaram a viagem até a terra do príncipe dos dentes de ouro, o grande Reino da Fantasia, onde fizeram novas comemorações, e que comemorações! Também eu estive presente, e até ganhei uma coxa de chapim(2), mas, por incrível que pareça, não é que continuei faminto?

Quem não acreditar, que vá investigar!

 

(1)Assim chamado nos contos populares húngaros o mar (ou rio) imaginário existente na fronteira do mundo da fantasia. Segundo uma explicação mais difundida, trata-se de uma corruptela do alemão “Ob der Enns”, que significa “acima do Enns”, nome de um rio na Alta Áustria, muito mencionado por soldados húngaros que haviam ido lutar e, ao voltarem para casa, contavam histórias de aventuras fantásticas que teriam vivenciado! (Nota de Ildikó Sütö)
(2) Pequeno pássaro conirrostro, i.e., de bico curto e cônico como o dos pardais. (Nota de Ildikó Sütö)

2 thoughts on “Semana Especial Fadas – A deslumbrante Rosa Dragonete – Conto Húngaro

  1. Olá, adorei connhecer sua página e sua forma de apresentr os contos.
    Gostaria de saber como localizar a bibliografia dos contos.
    Agradecida!
    Tereza

    1. Olá, Tereza!
      Quando eu sei o autor do conto que traduzo, indico o nome. Quando conheço o livro, menciono a referência bibliográfica. Mas, tem histórias que coletei faz muito tempo, em folhas mimeografadas, xerox antigos; outras, chegaram até mim pelas mãos de amigos… E não sei a origem, o autor. Gostaria de poder te ajudar. Caso esteja procurando alguma informação específica, diga que tentarei rastrear. Abraços.

Deixe um comentário para Ana Flávia Basso Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *