Trabalhando com histórias e educação infantil, um dos temas mais frequentes entre os pedidos que eu recebo é alimentação!
“Ana, por favor, uma história para o meu filho comer melhor!”
“Por favor, uma história para meu filho comer mais legumes e verduras!”
“Uma história simplesmente para o meu filho comer!”
A alimentação é um dos temas que mais nos preocupam ao longo da vida, principalmente pela sua relação direta com a nossa saúde, nosso bem-estar e a sociabilidade. Afinal de contas, a gente vive em uma sociedade que confraterniza… comendo! Sempre comemos em eventos sociais como churrascos, ceias, festas (casamentos, aniversários, formaturas), jantares de negócios, restaurantes com amigos ou familiares…
E, além de comer, falamos sobre comida, trocamos receitas, pesquisamos sobre o assunto. Mas, mesmo assim, muitos de nós não estamos 100% satisfeitos com a alimentação que temos hoje – há sempre algo para mudar, reduzir, aumentar, inserir ou mesmo cortar do cardápio!
E como é difícil mudar um hábito alimentar, não é? A gente sua a camisa… Agora, imagine quando nós pensamos na qualidade da alimentação das nossas crianças. A preocupação triplica!
Sabendo dessa dificuldade, é muito melhor a gente educar as crianças com bons hábitos alimentares, para que elas cresçam saudáveis e não sofram tanto no futuro…
A proposta aqui não é orientar quanto ao que sua criança deve ou não comer. E sim, trazer reflexões sobre vários aspectos da alimentação e quais histórias (e também como as histórias) podem nos ajudar no nosso dia-a-dia, na nossa comunicação com as crianças e na transmissão de valores.
Se você, a partir das reflexões, sentir a necessidade de algum acompanhamento específico sobre reeducação alimentar, procure um médico e/ou nutricionista.
A NOSSA ALIMENTAÇÃO FALA MUITO SOBRE QUEM A GENTE É!
A frase “somos o que comemos” ficou famosa e virou até título de livro! E ela revela que, por trás dos nossos hábitos alimentares, tem muito mais coisa do que a gente imagina.
Quando vamos fazer uma análise de como é a nossa alimentação hoje, percebemos que ela é influenciada por vários fatores:
- Nossa família de origem – o que aprendemos a comer quando éramos pequenos? O que colocavam na mesa e no nosso prato? Como era a rotina e os ritmos das refeições? Como eram as tradições e os valores da nossa família no que diz respeito à comida e ao ato de comer? Quais eram as crenças sobre escassez, fartura, divisão do alimento? Tudo aquilo que a gente aprendeu com a nossa família influencia o que a gente tem hoje como hábito alimentar.
- Nossa cultura: uma pessoa que mora no Pará tem, provavelmente, uma alimentação diferente de quem mora no Rio Grande do Sul. Ou mesmo quem mora no Brasil tem uma alimentação diferente de quem mora na Coreia do Norte. A região onde a gente mora – o clima, a vegetação, os alimentos que são produzidos ali e também as tradições do local – influencia os nossos hábitos alimentares.
- Nossa religião (ou não ter religião): várias religiões em seus livros sagrados mencionam alimentos desejáveis e não desejáveis, ou mesmo indicam alimentos que são possíveis ou não em uma celebração. Assim, muitas pessoas refletem em seus hábitos alimentares indicações provenientes de sua religião ou do fato de não terem uma religião.
- História: o momento da história da humanidade em que vivemos. E estamos em 2017! A gente tem que caçar, plantar e colher para comer? Ou a gente vai à feira e ao supermercado e tem acesso a vários tipos de alimentos? Inclusive alimentos nocivos a nossa saúde?
Todos esses aspectos compõem e influenciam o que chamamos de hábitos alimentares. E a gente tem que olhar para esses aspectos, principalmente quando estamos diante de uma criança e somos responsáveis por educá-la.
Mas tem algo que também influencia nossos hábitos alimentares e precisa ser sempre considerado: nossa individualidade, que se revela no que gostamos ou não de comer – são as preferências pessoais.
Além dos hábitos da família, além da cultura, da religião e do momento da história em que vivemos, nós temos preferências – alimentos que a gente gosta muito e outros que a gente não tolera. E a gente também tem que levar isso em conta quando a gente está educando crianças!
OS CONTOS E A ALIMENTAÇÃO INFANTIL
Deu pra ver que esse tema da alimentação é muito amplo, não é?
E assim como ele é amplo, amplas são as possibilidades de uso das histórias. Nos contos folclóricos do mundo inteiro, a gente vê tanto cenas de banquetes, refeições e jantares, assim como citações a alguns alimentos.
Nos contos de fadas tradicionais podemos ver, por exemplo, na “Gata borralheira”, a madrasta que joga as ervilhas no chão pra ela selecionar as boas das ruins, ou mesmo a presença de uma aveleira, a árvore que dá as avelãs.
No conto “João e Maria”, temos a casa de doces da bruxa, a bruxa querendo comer as crianças apetitosas e as pombinhas que comem as migalhas de pão deixadas para marcar o caminho.
No conto “O rei sapo”, o sapo quer comer e beber do prato e do copo da princesa, revelando o grau de intimidade que o ato de comer expressa..
Em “Chapeuzinho Vermelho”, temos a cesta de quitutes pra vovó e o lobo que quer saciar sua fome comendo pessoas.
Em “Os músicos de Bremen”, os ladrões dentro da casa se fartam com uma bela refeição, enquanto os animais olham pela janela.
Esses foram exemplos de como as histórias tradicionais que a gente já conhece, contêm imagens que fazem menção a alimentos ou cenas de refeições. E já podemos aproveitar e usar essas imagens com as crianças na hora de comer!
Um conto de fadas tradicional me ajudou muito num momento delicado com a minha filha, que sempre foi bastante seletiva na hora de comer. O conto muito conhecido é “Os três porquinhos”. No conto, o lobo assopra a casinha pra tentar comer o porquinho que está dentro dela, não é? A partir dessa imagem, uma “brincadeira” foi introduzida na hora de comer, depois de ter contado a história várias vezes para minha filha.
USANDO UM CONTO DE FADAS NA HORA DE COMER
Certo dia (um daqueles dias inspirados…), eu usei o enredo dos “Três porquinhos” para fazer minha filha comer coisas diferentes pois, na época, ela só queria comer um prato cheio de alface, algumas azeitonas e macarrão com molho de tomate! Nada muito saudável, ainda mais quando só se quer comer isso um dia após o outro…
O que eu fiz foi o seguinte: o porquinho vai ser o alimento preferido da criança no prato. No caso da minha filha, a azeitona. Com as outras comidas que estão no prato e que a gente quer que a criança coma ou experimente, construímos uma “casinha“, cobrindo o porquinho (o alimento principal). E o lobo é a criança que vai comer a casinha pra conseguir chegar até o porquinho!
A cada garfada, a criança come um pouco da casinha e começa a ver o porquinho, que ela comerá depois de ter acabado de comer a casinha.
Podemos fazer vários montinhos no prato, várias “casinhas”. E, dessa forma, a gente vai conduzindo a refeição, num clima agradável, com harmonia e a criança vai se divertindo e comendo.
Bom, essa foi só uma ideia. Você não precisa usar da mesma maneira como deu certo com a minha filha. Com esse exemplo, tenho certeza de que você terá outras ideias de acordo com a sua realidade e com a sua criança.
Se quiser se aprofundar mais um pouquinho, confira o vídeo abaixo: